Nunca foi novidade para nenhum de nós que moramos em Boa Vista a forma como os brasileiros que viajam de carro são tratados na Venezuela, uns com mais e outros com menos sorte, porém todos com as mesmas histórias de extorsão em vários pontos de controle, seja da polícia ou do exército. Mas quando a colombiana nos alertou sobre o perigo que corríamos nas próximas alcabalas entramos em pânico. Chegar a San Cristóbal, que fica há 50 minutos da fronteira em território venezuelano, em paz foi um alívio… Mal sabíamos o que nos aguardava no outro dia! Partimos cedinho com destino a San Juan de los Morros e cada parada de controle a gente temia que algo de ruim acontecesse. Embora estivéssemos todos documentados qualquer motivo seria motivo de uma “multa”. Lembram da “multa” que queriam nos aplicar por obedecermos uma parada a direita e que logo depois uma lei venezuelana, do nada, proibia parar a direita? Coisas desse tipo acontecia constantemente! Porém, o ponto mais trash da nossa viagem aconteceu nesse rodovia, entre San Cristóbal e San Juan de los Morros. Fomos atacados por cinco militares da guarda nacional como se fôssemos bandidos de alta periculosidade, nos trataram com toda falta de educação possível. Ficamos ali, a mercê daquela corja, por uns 50 minutos debaixo de um sol escaldante no meio da rodovia. Depois de terem feito o “trabalho” deles nos liberaram sem um pingo de escrúpulo. O que alegrou meu coração foi ver aquele militar arrogante, suando igual porco em véspera de morrer, usando gandolas de mangas compridas naquele clima infernal, procurando drogas no nosso carro, tirar a boina, passar o lenço na testa derretendo de calor e dizer: “Es licito”. Não encontraram nada que pudessem nos prejudicar, ou melhor, não armaram nada contra nós. Saímos daquela alcabala revoltados com o que havia acontecido, também com muito medo do que eles poderiam ter infiltrado no nosso carro sem que percebêssemos, pois isso poderia ter acontecido; o conselho daquela colombiana não saia da nossa mente. Mais adiante seguiríamos até Valência, antes de San Juan de los Morros, mas achamos por bem seguir outro caminho e desviar a rota que tínhamos dado aos militares carniceiros! Sabe lá Deus o que tanto um deles conversava ao telefone enquanto lia nossa placa e documentos ou o que tramavam (?) para que fôssemos pegos no próximo ponto de controle. Exagero? Não, gente… estar fora do seu país e em uma situação de humilhação e impotência que os guardas venezuelanos nos colocaram era sempre um perigo constante. Até mesmo porque a colombiana nos relatou histórias em que eles forjavam tráfico internacional de drogas como motivo de extorsão! Imaginem a nossa situação…
Ainda atônitos com esta maldita parada militar, seguimos viagem! De repente começa a escurecer e os meninos desligam o ar-condicionado e pedem pra que a gente abra as janelas do carro, achamos aquilo estranho… mas tá, deixa! Enquanto eu e a Nati conversávamos, eles trocavam sussurros lá na frente, até que a Nati percebeu que o marcador da gasolina só tinha um pauzinho! Jóia, muito jóia… Esquecemos de completar o tanque e agora estávamos no meio do nada, numa rodovia sem iluminação, mato pra todo lado e nem sequer uma alma vivente no meio da rua para poder pedir socorro! O GPS marcava 50km até o próximo posto de combustível mas a gente não tinha certeza se a reserva aguentaria até lá; logo em seguida o sinal vermelho acendeu! Quanto mais o Júnior dirigia mais longe ficava este bendito posto. 30 km passaram e nada desse posto aparecer, até que vimos luzes de cidade e nos alegramos, porque ficar sem gasolina na VE parecia até piada, rs. Esta cidade era muito pequenininha, um lugar ermo que dava até medo! Paramos para pedir informação e ficamos sabendo que naquela cidade não havia posto de combustível, somente na próxima cidade a uns 30 km. Um caminhoneiro olhou o painel do carro e disse que como estávamos na reserva a muito tempo não conseguiríamos chegar com o que sobrou no tanque. Entramos num aperreio só… Imediatamente perguntei para um tio que vendia bombons na esquina se ele conhecia alguém que vendesse gasolina em casa, a resposta foi um “não”. Foi aí que imaginamos ter que dormir dentro do carro até amanhecer e ficamos em silêncio sem saber como aquilo estava acontecendo. Depois de alguns minutos ele pediu para que descêssemos até o fim da rua e procurássemos por William, um senhor que poderia nos ajudar, esta era a única opção que tínhamos. A conversa com o tal do William não foi muito proveitosa, os três rapazes que estavam na calçada não se dispuseram a nos ajudar de jeito nenhum, nem mesmo disseram quem era o tal William. A Nati desfaleceu o rosto nesse momento… não tinha jeito mesmo. Passados alguns minutos tentando absorver a idéia de fazer do carro um hotel naquela noite, um daqueles homens disse que poderia nos ajudar e pediu que seguíssemos até a casa dele. Seguir aquele homem era um risco, mas um risco que precisávamos enfrentar. Entramos em uns becos até chegar a casa desse senhor que estava de moto a nossa frente, chegando lá havia uma família sentada em roda conversando, batendo papo e olhando sem entender o que estava acontecendo com a gente. Aquele senhor pediu para que esperássemos ali mesmo que ele iria trazer a gasolina para nós. A pouca luz que tinha naquele quintal permitiu a gente enxergar a movimentação de homens pelos tonéis, fazendo a transferência da gasolina para um galão! Aquele senhor voltou com a gasolina em mãos e com a ajuda dos meninos conseguiu transferir para o carro. A gente já tinha separado 20 mil bolívares para pagar mesmo sabendo que no posto um tanque cheio custaria 3 mil bolívares, mas aquela situação era tão excepcional que a gente fazia questão de pagar um pouco mais. Enquanto a gasolina era colocada no carro este senhor ficou curioso em saber quem éramos, de onde estávamos vindo, quantos quilômetros já tínhamos rodado, ele se empolgou com a nossa viagem, rs. Finalmente o problema da falta de gasolina foi resolvido e o Júnior perguntou quanto custava, ele disse que não era nada. A gente insistiu em pagar mas aquele homem se recusava a receber. Até que o Júnior deu os 20 mil bolívares e nós agradecemos pelo grande favor que nos foi prestado naquela noite. Fizemos a volta pra seguir viagem e perguntamos qual era o seu nome, ele respondeu todo alegre: Américo! O sr. Américo entrou naquela humilde casa, e de longe a gente podia ouvir as explicações que ele dava para a sua família a nosso respeito, todo empolgado. Chegamos em paz a San Juan de los Morros e felizes por saber que naquela noite o sr. Américo quebrou os paradigmas sobre os nossos (pre)conceitos em relação aos venezuelanos, afinal de contas generalizar será sempre um erro! Ele foi um anjo que não esperávamos.
Que bela lição!
Deus manda mesmo seus anjos em nosso socorro, agora viajar de carro sem gasolina já é querer milagre D+ kkkkk!
Tinha que ser dois homens pra deixar faltar a gasolina mesmo! hahaha
Brigado, Beth! Deus continue te abençoando! 😉